domingo, abril 25, 2004

CDS no 25 de Abril (1978)


Em 1978, a representação do CDS coube a Francisco OLIVEIRA DIAS, que, mais tarde, em 1981 e 1982, viria a ser Presidente da Assembleia da República:

«Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados: Os quatro anos que vivemos a partir de 25 de Abril de 1974 não nos permitem - porque são poucos e porque têm sido intensos- a distância necessária para pretendermos escrever ou dizer já aquilo que na história há-de ficar.
Tenho, porém, a certeza de que a data que hoje celebramos há-de sempre encabeçar um capitulo diferente da história de Portugal. Capítulo em que hão-de figurar deliberações tomadas nesta Casa e as suas consequências, em que hão-de ser referidas personalidades hoje aqui presentes; em que aquilo que no dia a dia nos apaixona, com tonalidades de entusiasmo ou de desgosto, em regra terá desaparecido, na medida em que uma coisa são os sentimentos apaixonados dos homens e outra são ou serão os juízos rigorosos da história.
Mas o tempo há-de confirmar o sentido das comemorações que esta Assembleia hoje renova.
Na história de oito séculos da nossa Pátria, abriu-se um capítulo novo, naquela madrugada da Revolução e nos dias de deslumbramento que se lhe seguiram. (...)

Num país, mesmo pequeno, uma flor só não é a Primavera, e apenas uma cor não pode exprimir a liberdade. "Liberdade, cor do homem" - como dizia André Breton -, isto é, o direito e o dever que cada homem tem de ter e de aparecer com a sua própria cor.Era a liberdade que, tal como prometia o manifesto do 25 de Abril, não pode deixar de ser entendida como causa e efeito da justiça.
Liberdade que é sinónimo de responsabilidade, que como tal a vemos, uns nos outros - e os outros e a história hão-de ver em nós. (...)

Vivemos, de facto, tempos difíceis!
Mas não é nos tempos fáceis, nem é fugindo às dificuldades que os homens, as instituições e os povos dão provas daquilo que são, que valem ou que merecem.

E das dificuldades há ilações que não é legítimo extrair nem propagandear.
Não é legítimo, nem honesto, que quem é mais responsável pela crise económica em que vivemos intente aproveitar-se agora das consequências daquilo que fez, ou mandou fazer, para pretender captar o descontentamento de um povo que sofre, tentando mais uma vez voltá-lo contra o caminho da sua própria sobrevivência.
Não é legítimo, nem racional, atribuir à liberdade, ou ao 25 de Abril, ou ao povo, as consequências destruidoras de um processo diferente, que no movimento democrático dos militares se enxertou; que pretendeu repetir, e em muitos passos repetiu, em Portugal o desenvolvimento da estratégia das vanguardas revolucionárias, que em toda a parte onde foram experimentadas - e em Portugal também não só não resolveram os problemas dos povos que a sofreram, como atraiçoaram sempre qualquer ideal de quem a tenha aceite como método para alcançar objectivos generosos.
Não é legítimo, nem racional, atribuir ao 25 de Abril ou à liberdade as culpas de um processo diferente, que sobretudo até 25 de Novembro de 1975, submergiu os ideais e as promessas e asfixiou a liberdade que o povo português esperava, que merecia e merece, e que soube defender heroicamente, contra a intoxicação mais profunda, as ameaças mais torpes e os atentados mais graves de que foi vítima.
Não é legítimo, nem respeita a dignidade humana, não corresponde às evidências que nos apresenta a conjuntura nacional e internacional, pensar ou pretender que a resolução das nossas dificuldades deva procurar-se de novo pela força, caçando bruxas, enchendo prisões, vingando agravos com novas injustiças, procurando novas vitimas. Em suma, e para falar claramente, não é legítimo, não respeita a dignidade humana, não corresponde às evidências e é um insulto aos Portugueses e uma traição a Portugal apontar como caminho para a resolução das dificuldades o apelo ou o incentivo à ditadura, seja quem for, diga o que disser o pretendido ditador, parta de onde partir o seu cavalo ou a sua galera.

Aquilo que os Portugueses sofrem não é inédito! (...)
Porém, quando outros povos venceram dificuldades maiores, os Portugueses hão-de também ser capazes de vencer as suas.
E para isso não é preciso vender a independência nem a dignidade nacionais. Nem é preciso escondermo-nos no nosso orgulho ferido, fugindo das mãos que, lealmente, nos quiserem ajudar.

A aposta europeia de Portugal não colide em nada com o mais genuíno portuguesismo, como não feriu a personalidade própria dos povos já associados no Mercado Comum. Colide, sim, é com os nossos complexos de país atrasado na Europa, com a preguiça, com a desorganização e a incompetência, quando temos de trabalhar aqui, pelo menos, tanto e tão bem como trabalham os nossos emigrantes.
Portugal europeu é possível se os Portugueses quiserem, em liberdade e graças ao 25 de Abril.
Nada disso é possível se as instituições democráticas forem subvertidas e alguém pretender obrigar os Portugueses a fazer à força aquilo que, em liberdade, ainda não conseguiram. Mas podem conseguir e querem conseguir.

Quatro anos volvidos, esta a perspectiva que o 25 de Abril abriu aos Portugueses que a Europa olha com admiração, por terem repelido uma ditadura velha e logo outra ditadura, que aparecia de novo, mas era ainda mais velha do que aquela em que a maior parte de nós nascemos.

Em 25 de Abril de 1978, experimentado por tudo quanto já passou, enfrentando com determinação a dureza do trabalho e qualquer ameaça às instituições democráticas entretanto criadas, o povo português defenderá a sua liberdade e alcançará a justiça e os padrões de vida a que tem direito.
Este o sentido da posição que o CDS assume na actual conjuntura política e económica.
Hoje, na nossa opinião, esta a melhor homenagem aos homens que fizeram o 25 de Abril e aos que, entretanto, o defenderam de todos os enganos, ameaças e traições.

O CDS acredita que Portugal livre pode contar com os Portugueses. Com as instituições democráticas, o povo português afirmará de novo a sua capacidade perante o Mundo e perante a História, perante a memória daqueles portugueses de outros tempos que tantas vezes venceram dificuldades e dúvidas muito mais graves do que aquelas que se nos deparam.
O CDS acredita que o povo português saberá sempre distinguir as propostas sérias dos jogos fátuos. Tudo está nas suas mãos e por isso o povo terá o que merece.
Portugal livre vencerá!


Responsabilidade que devemos querer e teremos de assumir, perante Portugal e o mundo, hoje e na história.
Tenho consciência de que continuam sem resposta satisfatória muitas das perguntas que o Sr. Presidente da República nos dirigiu aqui, faz hoje um ano. Nessa sessão, como desde que foi eleito, o Sr. General Ramalho Eanes falou, como lhe cumpre, em nome do povo que lhe atribuiu o seu mandato, com uma firmeza a que, por nós, não deixaremos de prestar, de novo, a mais convicta homenagem.
Perguntas claras e tão exigentes, como eram e são os requisitos e as acções necessários para dar cumprimento integral às promessas do 25 de Abril. Respostas necessárias, que desafiam a capacidade dos homens e a complexidade dos mecanismos de deliberação e de execução da orgânica do Estado; que não poupam a ninguém a obrigação de um empenhamento pessoal para as construir; em relação às quais, na complexidade, dos tempos, mesmo as medidas acertadas, como muitas das que já foram decididas, requerem muito esforço e algum tempo para que se vejam e se vivam as suas consequências positivas.»

[ Ver “Diário da Assembleia da República”, I Legislatura, Sessão 2, n.º 065, págs. 2463-65 ]