domingo, maio 02, 2004

João Pedro Henriques

A propósito de dois posts aqui publicados [v. O faccioso de serviço e Sobe & Desce], o jornalista João Pedro Henriques do jornal PÚBLICO enviou-nos a seguinte carta, que publicamos na íntegra:

Lisboa, 29 ABR 2004

Caros blogueiros do Caldas,

Hoje reparei em dois textos que me dedicaram. Ambos são insultuosos na medida em que me acusam de fazer “jornalismo de encomenda”. Se, no tempo em que foram jornalistas, ITP e PPM fossem acusados do mesmo, também se considerariam insultados, como não podia deixar de ser. Quero com isto dizer que terão necessariamente de concordar comigo quando digo que aquilo é, mais do que uma crítica, um insulto. É só por se tratar de um insulto é que vos escrevo.
Escrevo – mas não pensem que levo a coisa demasiado a sério. Já defendi, no Glória Fácil, que o debate na blogosfera era, por vezes, demasiado doce e cordial, muito “brandos costumes” e etc. E que aqui faltava, por vezes, uma certa rudeza, para não dizer agressividade. Também já me excedi (como o Blog do Caldas agora se excedeu), sendo que numas vezes pedi desculpa e noutras não.
Ponho o vosso excesso à conta de alguma crispação, crispação que, para mim, depois daquela vaia na Avenida da Liberdade (e da respectiva ampliação pelos “media”) é muito natural. Como ex-jornalistas, ITP e PPM sabem bem que quando a conjuntura aperta para os políticos, os jornalistas começam a ser os bombos da festa. É a vida, como dizia o outro.
Mas adiante, vamos ao essencial. Como já expliquei em tempos no Glória Fácil (GF), tento, ao máximo, não deixar que o blogue e o jornal onde trabalho se confundam. O GF é uma brincadeira, o PÚBLICO é coisa séria. Mas mesmo sendo o blogue uma brincadeira, ela tem, para mim, algumas regras.
Uma dessas regras é a de me recusar terminantemente a defender-me no GF de críticas (ou acusações ou insultos, tanto faz) surgidas na blogosfera devido a textos meus no PÚBLICO. Não uso o GF como duplicação de meios de defesa em relação aos que já disponho no próprio PÚBLICO. No blogue defendo-me das críticas de que sou alvo na blogosfera por causa daquilo que escrevo no blogue. No PÚBLICO defendo-me das críticas recebidas no jornal sobre o que no jornal escrevo. Se não tivesse estabelecido esta regra, as coisas poderiam tornar-se extremamente confusas. No limite, eu poderia a certa altura usar o meu espaço no PÚBLICO (que, por vezes, é de opinião) para responder a críticas recebidas por aquilo que escrevo no GF. Fiz-me entender?
Poderão afirmar agora que não faz sentido escreverem uma carta ao PÚBLICO sempre que discordarem do que eu escrevo no jornal. Queria dizer que não peço isso: o Blog do Caldas pode continuar a bater à vontade no ceguinho (moi), que o ceguinho não se vai defender usando o seu blogue (ou o PÚBLICO, visto que aqui não chegou nada). Quando muito escreverei mails particulares, como este.
Por outras palavras: o Blog do Caldas usa o seu direito de criticar quem quer que seja e eu uso o meu de NÃO me defender. E se, ocasionalmente ou por sistema, quiserem fazer de mim saco de areia, sirvam-se à vontade. Eu preferia, sinceramente, que isso não voltasse a acontecer. Mas sou compreensivo. Se forem pagos por isso, mais compreensivo serei.
Cumprimentos,

João Pedro Henriques

PS - Só mais uma coisa: o Blog do Caldas não é, felizmente, anónimo. Tem uma ficha técnica e isso dá-lhe transparência. Mas essa transparência seria significativamente reforçada se cada um dos ‘posts’ fosse assinado. Assim a coisa é demasiado “colectivista”, por assim dizer. E fica a ideia que pensam todos igual. Calculo que essa ideia vos seja desconfortável.


Nota dos editores - Apenas seis breves comentários:
1. Ainda bem que JPH não leva a coisa demasiado a sério. Nós também não.
2. Este é um blog assumidamente partidário. Ninguém vem aqui ao engano. O mesmo não se diga do “jornalismo” que cada vez mais se pratica na secção política do PÚBLICO. Isenção, distância, imparcialidade, objectividade são regras e conceitos básicos – sobretudo na imprensa de informação diária – que sumiram, ali, por completo. Para serem substituídos por militância e alinhamento do “quanto-mais-à-esquerda-melhor”, misturando frequentemente informação com comentário, opinião e insinuação. Será que já não vêem? Será que já não se lêem sequer?
3. Um pouco confusa, mas curiosa, a explicação entre o que é do PÚBLICO e o que é do “Glória Fácil”. Mas a separação é difícil quando o PÚBLICO não se distingue do “Glória Fácil” e de outros blogues BE ou EQT que andam por aí.
4. Lamentamos o insulto, se assim foi sentido. Não cremos que objectivamente assim possa ser visto. Mas penitenciamo-nos de qualquer ofensa que possa ter sido sentida. Apesar da nossa natureza assumidamente partidária, não é essa jamais a nossa intenção. Mas criticar o que é manifestamente errado e repudiar o que nos atinge injustamente, com carácter obsessivo, em género propagandístico e com meios claramente desiguais.
5. Engana-se quanto a sermos pagos. Mas JPH é certamente pago no PÚBLICO. No “Glória Fácil” é que supomos que não.
6. Quanto ao post-scriptum, agradecemos a sugestão. Mas JPH, talvez por estar a resvalar tanto para a extrema esquerda, parece já não entender a diferença entre “equipa” e “colectivismo”. Um dia, a gente explica-lhe.
Sans rancune.